Compêndio de Coisas Guardadas

Ninhos Surreais

O bem te vi me chamou cedo antes do galo cantar,

Escrevo-te com a alma vergada de preocupações,

Para mim é sempre o mesmo um ritual, recolher as pitangas amarelas,

Nos galhos carregados,

Afastar os velhos fantasmas do caminho, as cinzas da quarta feira

Eu não gosto quando os pássaros chegam tão cedo antes do amanhecer benzer meu solo, antes de se encerrar a folia

Hoje eu tenho uma terça pintada de laranja e olhos coloridos artificialmente,

De conto a conto retiro um ponto e desacelero o coração,

Logo sei que voltas, como quem volta com o desejo mais forte de amar,

Têm sido assim os meus carnavais, minhas esperas, as esperanças balançadas ao vento

Como roupa estendidas no varal, a calça tentando chamar a atenção do vestido,

Deve ser por isso que quase sempre tu vives nua,

E eu descalço percebo mais facilmente a alegria no chão, ela sempre nos festejou se espalhando por tudo,

Ontem eu fiz um quadro a óleo para retratar os fatos que ocorrem na avenida

Mas nada de realismo, no mundo surreal podemos ser o que desejarmos e os desejos podem ser um pedaço de nós de cabeça para baixo, indo ou voltando

Os olhos nas costas e o sorriso na testa,

Agora a bem te vi teve filhotes, eles parecem sustos estrelados com pequenos bicos abertos de fome,

O aniz floriu na poça sobre a lua cheia, parece que li o teu nome escrito na luz,

Choveu a noite toda de ontem e as estrelas estão lavadas,

Confesso que quando tudo isso acontece sereno a minha alma,

Limpo a maquiagem, a ânsia da espera é para podermos dividir cada fato,

O seu sorriso surreal se insinua já chegando, estou a preparar os lábios,

Os beijos passarinhos sempre fazem ninhos na minha boca

E os teus beijos ficam enfeitando a minha vida

A manhã tudo continua