Instigado pela curiosidade em estudar o mecanismo dos crimes que assolam o nosso cotidiano, levando a insegurança na sociedade e a desconfiança em nossos semelhantes e nas leis que não consegue nos proteger adequadamente, durante anos arrojei-me em campo, assinando os principais jornais do estado e acessando portais de notícias, interessado quase que exclusivamente nas matérias policiais, deslocando-me para os cenários das ocorrências, com o objetivo de pesquisar in loco, quando as informações colhidas nas mídias não me ofereciam um entendimento satisfatório do acontecido, entrevistando informalmente circunstantes da cena, quando não os próprios envolvidos. Boa parte dos episódios não valia senão uma rápida conferida, enquanto outros mereciam registros mais duradouros, por algum fator inusitado que o caracterizou, mesclado à linguagem ficcional, em contos literários. Três deles incorporam esse volume:
1 – Jogo Perigoso. Num passeio ao shopping, casualmente um adolescente reencontrou um ex-colega de escola. No agradável bate-papo, revelaram o desejo de voltar a se contatar, com ideias sugestivamente sexuais. Mesmo consciente de sua opção de gênero, ele ainda não havia quebrado a barreira do ritual de passagem. Ficaram trocando confidências apimentadas no aplicativo do celular, até o novo encontro, o qual, por proposta do ex-colega, começaria como um jogo sadomasoquista de simulação, em que este, a princípio assumiria o lado sádico, com a promessa de os papéis se inverterem. Deixando-se ser subjugado ingenuamente, nos primeiros gestos, desesperado, o adolescente percebeu que estava à mercê de um psicopata.
2 – Casos de Busão. Na primeira vez em que pegou num volante, ele se conscientizou de que sua vida estaria associada à direção. Ao completar a idade mínima de mudar a carta de habilitação à categoria profissional, assumiu a função reservada pelo destino a ele, como motorista de diversificados veículos, até se fixar em ônibus urbano. Com o tempo, sofrendo o desgaste das horas no batente, testemunhou outros contratempos se incorporarem ao risco ergonômico da profissão, como o assédio da violência urbana, na figura de bandidos que faziam dos assaltos aos urbanos o meio de ganho de vida; e a insegurança do trânsito caótico, com índices alarmantes de acidentes, mortes e mutilações.
3 – Corrida Incendiária. O taxista marcava hora no ponto de táxi, lamentando o dia quase improdutivo e sua precária situação econômica, sem condição sequer de fazer a manutenção de seu veículo, o ganha-pão, quando um rapaz o abordou, combinando uma corrida a uma cidade do estado vizinho, onde tinha uma pendência a resolver, por um preço que supostamente lhe daria um respiro. Mas o carro suportaria a viagem? E o motivo do passageiro era sincero, ou havia uma intenção ilícita no frete?
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